segunda-feira, 21 de novembro de 2011

George Harrison: "Quer que eu vá com você?"



Bateu esse documentário do George. Feito por Martin Scorcese, o filme conta a vida do beatle que eu mais gosto. Ainda estou digerindo, como um mantra que demora para ter um significado sólido. Ainda tenho que rever, escutar, absorver muito mais sobre o que George Harrison foi.

Lembrando aos poucos, destaco da primeira parte da fita: a fase pré-beatles e o início de tudo:

Músicas raras e histórias memoráveis como as da primeira vez que George encontrou Aunt Mimi, a madrasta do John, ou da foto encontro com John no ateliê de Astrid Kirschher, garota que tirou muitas das primeiras fotos dos Beatles; a beatlemania e "Don't Bother Me", o começo das composições e do restrito espaço para as músicas de Harrison no quarteto.

Segunda parte, a mais profunda: 

O encontro com a espiritualidade Hare Krishna; a influência de Ravi Shankar; Sgt. Peppers; muitas músicas e tolhimento da criatividade de George; vídeo incrível de Paul discutindo com George; a separação dos Beatles e o começo do clássico All Things Must Pass; O triângulo entre George, Eric Clapton e Patty Boid (esposa de George que o largou para ficar com Clapton. Foi tudo amigável); os mantras, a relação de George com os amigos Dylan ("I'd Have You Anytime") , Tom Petty, Roy Orbison e outros muitos; as drogas; o filho; a nova esposa até o resto da vida; a experiência quase-morte e a morte.

Sempre vou lembrar dos mantras, da maximização do perfeccionismo, da genialidade, do humor, da calma para cortar o jardim de sua casa, das canções, do concerto para Bangladesh e de muitos outro momentos do filme e da vida dele. 

Mas creio que o que fazia George transitar com extrema leveza entre seu dois mundos (o material e o transcendental) era a bondade genuína. Assista até o fim e diga-me se a frase final de Ringo não é de chorar.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O pato... quém quém...




A certo ponto Sá diz que o João Gilberto resfriado só poderia cantar a música "O Pato" e somente a parte do "Quém, Quém". E isso me remete a três semanas atrás quando fui a Madrid e fiquei numa república de alemãs, um marroquino e um franco-inglês. Todos muito simpáticos.

E papo vai e papo vem, sempre sobra um assunto assim: 
"Ah, você é do Brasil, muito samba, mulheres, praia", todos menos o inglês.

"Ahan, tem tudo isso sim e mais um monte de coisa.", disse, conformado em não começar uma teoria sobre a tropicalização brasileira no exterior.  

Subitamente, o inglês meio francês disse: "Você conhece João Gilberto?"

"Conheço", disse, surpreso. "Você gosta de Bossa Nova?"

"Gosto! Mas a melhor é a música do Pato".

E começou a cantar:


O Pato
Vinha cantando alegremente
Quém! Quém!
Quando um Marreco
Sorridente pediu
Prá entrar também no samba
No samba, no samba...

Com um aceitável português e um sotaque hilário (inclusive pronunciando os "Quém, Quém"), o gringo me fez pensar como o mundo é bem louco. Um franco-inglês em Madrid cantando "O Pato" de João Gilberto. 

"Quém, Quém".

   

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Hunter S. Thomson: um cara bem sucedido

Justamente ele que mergulhava nos medos e delírios das pessoas e de si próprio, venerando a inconsciência e os limites da integridade humana, e destroçando o sucesso tradicional do estilo de vida americano a cada parágrafo, pode ser considerado bem sucedido.

Não por que inventou um estilo de jornalismo ou por que se tornou um ícone pop de rebelia aos padrões capitalistas, mas por isso:


Na página oficial do Kentucky Derby, o mais famoso evento de turfe dos EUA e cenário e objeto para o trabalho que deu traços para a origem do jornalismo gonzo, há um espaço para o texto The Kentucky Derby is Decadent and Depraved, de Thompson, escrito em 1970 para a publicação Scanlan's Monthly.

Como você pode imaginar, o texto destroi a burguesia louisvilliana mostrando os bastidores do evento e, claro, quase não falando do menos importante em questão, a corrida.

Mas o que impressiona é que um escrito despretensioso (e por isso genial) pode se tornar, para mim, maior que o próprio acontecimento, a ponto de ser lembrado pelo próprio evento que foi escancarado e diminuído. O Dr. Gonzo fez o que todo jornalista sonha: escrever o que der na cabeça sem amarras editoriais e ser lembrado por isso 40 anos depois.

Para mim isso é sucesso.

PS: A imagem é um desenho de Ralph Steadman, inglês que acompanhou Thompson no evento supracitado e participa do texto. Leia lá.

A elegância sob o efeito do rum




Ainda não vi Rum Diary, filme que narra a estada de Paul Kemp (er, Hunter S. Thompson) em Porto Rico em busca de trabalho, calor, mulheres e rum barato. Mas li  Rum: Diário de um Jornalista Bêbado (Companhia das Letras) e foi a primeira coisa que conheci  em profundo do jornalista que inspirou o gênero gonzo no jornalismo.

Esperava páginas repletas de viagens e chapação sem fim, tal qual sugere o filme Medo e Delírio em Las Vegas, de Terry Gilliam. (Tou ligado, vou ler o livro.) Porém, a elegância do sujeito ranzinza em escrever sobre San Juan, capital de Porto Rico, e suas histórias é impressionante. A descrição das bebedeiras, do sexo, das brigas e dos pensamentos de Thompson são despojados mas de maneira elegante. Cada erguida de sobrancelha ou enxugada de suor da testa é dita por um narrador que está dentro da história mas mantém uma distância dos fatos. É demais. Lembro da descrição de um dos funcionários do jornal de Kemp, quando soube que o jornal podia acabar.

"Nervoso, trocou o peso da perna esquerda pelo o da direita", parafraseando da minha cabeça mas tá valendo. Genial.

Cada imagem se forma fácil diante dos olhos do leitor. As ligações da mente de Thompson apesar de confusas são postas claramente, ouso dizer até objetivamente. A história das personagens, a composição psicológica, a paranoia, os inevitáveis arquétipos são simples e facilmente inteligíveis. Características inerentes ao jornalismo e ao pop.

O livro não tem um mote incrível. São apenas as histórias e reflexões de um jornalista bêbado em uma cidade calorenta fora da América que procura algo novo de sua vida que não seja o frio e as mesmas pessoas de Nova York. (Hunter tinha 23 anos quando saiu de NY, demitido de um jornal. A época era 1960.)

Mas a escrita é atraente, mais especificamente as análises de Thompson ao final de cada capítulo são o que me levaram ir ao final de cada microhistória. A vida, o fracasso, a solidão... tudo entrelaçado em acontecimentos aparentemente triviais que fazem você pensar em como ele sacou a essência das pessoas e a sua própria.

Outro momento genial é quando depois de uma surra homérica, uma prisão injusta e dois dias sem dormir, Kemp caminha pela San Juan deserta, fria pela manhã e descorre sobre a beleza da cidade e o seu silêncio estranho. Linda passagem sobre a presença do fracasso e a vitória dentro de um mesmo homem.




 








e a chuva lá fora...




En se frottant au piano nostalgique...

sábado, 5 de novembro de 2011

Cronenberg + Kubrick sobre fazer cinema


"Nunca fui a uma escola de cinema. Sou um autodidata. Você tem que ver filmes. É incrível a quantidade de gente que quer ser diretor e não vê filmes. Necessita uma cultura profunda e não somente de cinema, mas em tudo", Cronenberg respondendo perguntas de leitores do El País.


"Para aprender cinema, o melhor é fazer um filme", Kubrick do livro "Stanley Kubrick - filmografia completa" de Paul Duncan.

É claro que o Kubrick viu centenas de filmes antes de fazer a sua primeira obra (o curta Day of the Fight). De acordo com o livro do Duncan ele via todos, filmes bons e ruins. Nos ruins ele só prestava a atenção nas movimentações de câmera. Quando começavam os diálogos ele lia uma revista.

Mas em suma, estou com o Kubrick.