terça-feira, 3 de abril de 2012

Kassin e o complexo de inferioridade da crítica musical brasileira



Dentre outras coisas (gap geracional atual, tropicalismo, vida de produtor-hype de cabelos brancos moderninho), Kassin fala do "pagar pau pra gringo" da crítica cultural brasileira:

"Tem uma coisa que me incomoda na crítica brasileira em geral... Percebo isto principalmente quando vou aos prêmios, sabe? É que existe a ideia de que a música popular é a porta dos fundos. É um erro. O Brasil sofre de um grande complexo de inferioridade em relação ao exterior. É muito mais provável você ver uma primeira página de caderno cultural com a Britney Spears ou a Whitney Houston do que com o Wando. Que morreu e... Até me surpreendi em vê-lo nas primeiras páginas! Na verdade, só morrendo ele conseguiu chegar lá. Se ele lançasse um disco de estúdio, ninguém ia dar a menor bola. Só se estivesse de calcinha na capa ou em qualquer outra situação polêmica. Um disco da Ivete [Sangalo] não é tratado com a mesma seriedade que um disco da Rihanna, por exemplo. É mais provável que um disco do Pretenders tenha boas críticas e melhores espaços nas publicações do que um disco do Barão Vermelho ou do Frejat. A grande maioria dos jornalistas usa as revistas importadas como principal fonte de consulta. Pegue a Fader [aponta para a revista norte-americana que se encontra sobre a bolsa do fotógrafo Daryan Dornelles], que é a que todos os jornalistas lêem e me diga... Qual a diferença entre a banda que aparece aqui e a Dorgas? Nenhuma! Mas aqui tem uma foto bonitona, sacou? E é a novidade da parada. É o que está foda! Aí a imprensa faz um movimento! Bota o pau na mesa e diz que é do caralho. E os sites e blogs repetem. É esta a lógica. Já fui a festivais lá fora: Roskild, Primavera Sound, Sónar... Você chega lá e, cara, a grande maioria, está uma merda! O som é um horror, todo mundo toca mal, desafina... Tecnicamente e esteticamente é uma merda. É banda sem estrada, é banda com gente que não sabe tocar... Mas eu acho do caralho! Estou falando de algo que vejo e que admiro, mas por que aquilo é melhor do que o que se faz aqui? Aquilo é tão pop quanto o que nós produzimos. Na minha concepção de música pop, Timbalada e Timbaland são a mesma coisa. Não pode haver aí uma escala de valores, nem muito menos de status. Não aceito estes parâmetros. Acho de uma ignorância só. Jay-Z e Mc Marcinho para mim são a mesma coisa. O que muda é o valor que as pessoas dão. E você percebe isto nos cadernos culturais. Cara, qual a diferença entre a Paula Fernandes e a Taylor Swift?! Nenhuma! É a mesma parada. Então porque ninguém comenta o disco dela com seriedade? Porque ninguém escreve um texto que não seja um ataque? Na crítica do disco da Taylor Swift os jornalistas parecem saber os nomes de todos os músicos e produtores que estão na ficha técnica! Cara, isto é complexo de inferioridade. E acho que ultimamente os jornalistas estão cada vez mais mal preparados. Os textos são fracos. E há também outra coisa: Se você tem uma revista, deveria falar bem do que está nela. Porque, afinal, você se dedicaria a falar de algo que odeia?! Porque não utilizar então este espaço para falar positivamente de outro artista?"

E ainda corrobora com o sentido de artista como processo e não como perpétuo quando fala do tecnobrega e da Gaby Amarantos. Sentido esse que é a natureza da música do próprio Kassin.

"Eu admiro muito estes fenômenos populares de musica eletrônica: O tecnobrega, o funk carioca, a cumbia villera, o kuduro... Para mim, presenciar o surgimento destes gêneros é como se eu estivesse vendo o nascimento do samba. Você está vendo um estilo sendo gerado, ganhando forma. Não creio que o tecnobrega ou o funk sejam diferentes do samba quando este surgiu. Os padrões vão se repetindo até chegar ao ponto em que se tornam um recurso estilístico definível. Esteticamente, é algo muito interessante de se acompanhar. Há um frescor nestes sons, por não estarem atrelados ao formato de disco, por não haver um assessor de imprensa e por não estarem inseridos dentro dos padrões tradicionais de consumo... As músicas são crônicas do que acontece durante a semana. Elas tocam por um tempo e depois somem. Você não acompanha o artista propriamente... Acho um fenômeno interessantíssimo."

Daqui. O URBe que avisou.

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